quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

A RESPONSABILIDADE DO HERÓI NEGRO

Um dia desses, nessas conversas de bar, tava conversando com uns amigos sobre filmes, atores, atrizes. Conversa vai, conversa vem surgiu o nome do ícone e máquina de fazer dinheiro Will Smith. Falamos sobre os seus filmes, todos animados, até que uma hora a vida do astro foi colocada em xeque devido ao seu desinteresse pela comunidade negra norte americana. Foi colocado na mesa que Smith era rico, mas que toda aquela pompa e poder somente serviam para si, ele não ajudaria em nada e viveria em um universo paralelo dos (poucos) ricos e famosos negros americanos. Uma outra vez lembro que tiveram oportunidade de assistir ao programa de Oprah Winfrey e acharam horrível, sem grandes surpresas e a comparação veio de imediato, o programa parecia mais uma versão norte americana de Hebe, que não tinha qualidade e que era simplório demais. Para que nem todos os artistas fossem jogados no lixo, ressaltou-se Denzel Washington como o “Midas”, ele sim faria personagens enriquecedores e contribuiria para o crescimento da comunidade negra com sua arte. Ou seja, uns heróis somente na tela e outros estendiam seus papéis também á realidade.
Fiquei pensando se todo artista negro realmente tem a função/obrigação de estar sempre envolvido em produções que tivessem uma carga dramática referente às vivências da comunidade negra?! Não tem! Ele tem direito de fazer o que quiser. Recentemente saiu a noticia que Smith estaria envolvido em um “projeto ancestral” fazendo o papel de um dos últimos faraós negros do Egito antigo. A provável super produção serveria para consolidar a carreira de Will Smith em um projeto sério que ao mesmo tempo envolvesse “suas raízes”. Ou seja, responsabilidade estritamente planejada com marketing absoluto.
O caso de Oprah é um pouco diferente. Tudo que ela toca vira ouro. Seu programa é o mais assistido nos EUA faz tempo, recebe celebridades de grande porte se emocionando ou pagando micos hilários e faz tanto sucesso que seu formato foi exportado em todo mundo – se não fosse por Oprah não teríamos, por exemplo, o sofá da Hebe e programas como Márcia e Casos de Família (entenda isso como quiser!). Apesar de o seu programa ter um gosto duvidoso Oprah consegue separar o joio do trigo, com o dinheiro que consegue desenvolve projetos como A Bem Amada e Aos Olhos de Deus, duas obras clássicas literárias negras mundiais e se envolve em filmes inesquecíveis do porte de A Cor Púrpura. Se ela lê um livro, gosta e anuncia em seu programa, no outro dia o livro entra na lista dos mais vendidos do país. Além de tudo é a mulher negra mais rica do mundo, a personalidade negra mais rica do mundo e a segunda celebridade mais rica do mundo. Ufa!
Colocar a responsabilidade do destino de toda uma comunidade nas costas de uma pessoa não é um movimento saudável. Como todos os artistas do mundo, esses e outros artistas negros tem seu ego, suas vontades e envolvem-se em projetos que bem entendem. Há uma cobrança com estes artistas negros com real poder, pois eles são poucos, geralmente são envoltos na máquina feroz da cultura branca que coloca os negros “no seu devido lugar”. As pessoas esperam deles projetos reveladores, dramáticos, que falem sobre sofrimento, racismo, superação. Como uma obrigação e não de livre e espontânea vontade. O artista negro que chegasse a um patamar diferente de seus colegas de trabalho, renegados ao figurino de empregados domésticos e cenário da cozinha, teria que construir sua carreira evidenciando os heróis e dramas da comunidade negra por todo o mundo. Mais ou menos como Denzel Washington que já participou da guerra civil americana como um soldado que luta por liberdade e justiça, fez Malcolm X, o lutador Huricanne e Steve Biko. Para ele só falta Fanon! Mas é bom frisar que mesmo ele fez filmes horrendos (O Diabo Veste Azul), e que não acrescentavam nada a história da comunidade negra como Chamas da Vingança, O Gangster e Dia de Treinamento. E é um grande ator, sem dúvida!

Colocar demais a responsabilidade de uma comunidade em cima de um artista significa que o sujeito não tem coragem de mudar dentro do seu espaço a sua comunidade. Aqui no Brasil casos como o de Lazaro Ramos também volta e meia são citados. Ele seria a salvação da arte negra, sendo reconhecido pela sua responsabilidade e talento. Temos que fazer valer uma coisa: o caso da arte negra no Brasil é bem mais complicada que o norte americano, ninguém disso duvida. O mesmo Lázaro que fez riquezas como Madame Satã e o programa Espelho faz coisas como a série O Pai Ó! Projetos completamente diferentes, que envolve ideologias diferentes e feito para públicos distintos. Mas como se trata de arte o público vai entender de forma distinta estes projetos. Uns gostam outros odeiam, jogam pedra e tudo! E cabe ao público tirar proveito ou fazer as críticas sobre o projeto, é para o público que o artista faz o seu ofício.
Mas independente do rumo da carreira, a responsabilidade da nossa comunidade é de todos nós. Do ator que realiza o papel maravilhosamente bem, do roteirista que escreve e reescreve a história que inventa (ou não), do diretor que comanda pondo ordem em toda a produção, do exibidor que se compromete em colocar determinado filme com boa temática nos cinemas, do patrocinador que vê que toda aquela história pode também gerar lucro com responsabilidade e finalmente o público que avalia o produto final, coloca tudo na balança, lembra dos ensinamentos que a arte lhe proporcionou ou joga tudo fora no primeiro lixo que encontrar pela frente e esquece. O papel é nosso, afinal de contas, todos nós somos heróis.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

AFINAL DE CONTAS... CINEMA NEGRO EXISTE?

Cinema negro... Fico me perguntando em mais um ano escrevendo em um blog falando sobre “cinema negro” se este “cinema negro” realmente existe!... Não seria uma conotação meio estereotipada, criada apenas para diferenciar uma arte que pode ser igualitária, sem problemas, já que em tese todos assistem cinema e com ele se identificam? Ou cinema negro apenas é uma das vertentes dos vários cinemas espalhados por este mundo tão diferente? E se ele existir, será que este tipo de cinema poder ser misto em várias partes do mundo, pois com a diáspora as negritudes ampliaram-se, atingindo vários povos e formando outras culturas. Todo filme do “cinema negro” pode ser encarado como um cinema político? Ou pode ser encarado apenas como diversão? E política negra também pode ser encarada como diversão?... Quantas perguntas!
Se seguirmos e adaptarmos a denominação de teatro negro feita por Christine Douxami para o nosso contexto, segundo ela esta denominação “pode tanto ser aplicada a um FILME que tenha a presença de atores negros, quanto aquele caracterizado pela participação de um diretor negro, ou ainda, de uma produção negra. Ou uma outra definição ser o tema tratado NOS FILMES”. Seguindo o primeiro pensamento de Christine cinema negro pode ser muita coisa (Os Bad Boys, Vovó Zona, Mulher Gato, Irmãos de Sangue, Hancock) ou qualquer coisa para ser mais preciso. Mas é na segunda afirmação que uma luz pode ser encontrada. O tema tratado.
Desta forma dá para afunilar bem o que poderia ser chamado de cinema negro. Os assuntos a serem abordados pelo roteiro seriam características do cotidiano da população negra, suas alegrias, dificuldades, seus amores, cultura, seus traumas e embates. Neste viés estariam pérolas como A Cor Púrpura, O Sol Tornará a Brilhar, A Bem Amada, Ali, Infância Roubada, Cidade dos Homens, Filhas do Vento, Vista Minha Pele dentre muitos outros.
Com a primeira definição de que cinema negro poderia ser qualquer filme que abrangesse o universo negro percebe-se o quanto o cinema branco (pois se existe um cinema negro é porque existe um branco em contra partida) está impregnado em todos os tipos de cinema seja ele nos EUA, Brasil ou África, sendo considerado como normal ou um arte que atinge a todos. Como a maioria dos filmes são protagonizados, produzidos, dirigidos, interessados por/aos brancos qualquer ponto negro em uma película poderia ser considerado um ato de resistência cinematográfica।Na segunda moldura de cinema negro o discurso importa e muito. Cinema negro então seriam as produções norte americanas baseadas em clássicos da literatura daquele país, os filmes do visionário Spike Lee, o cinema popular da Nigéria, o cinema produzido pela nova geração de cineastas brasileiros que vêem da favela (de onde vem os negros na maioria das vezes) ou o cinema pan africanista que existem para exercitar um pensamento que os governos africanos nunca conseguiram por em prática verdadeiramente.
E se existe cinema feito em Hollywood, em Bollywood, em mandarim ou o queer cinema (cinema feito para homossexuais, por homossexuais), um cinema branco, cinema de arte, cinema novo, cinema comercial/pipoca, por que não existir cinema negro?! Algum pecado nisso? Algum pecado em fazer filmes dirigidos a uma determinada parcela da população que só nos EUA corresponde a mais de 40% da bilheteria? E olhe que lá eles são minoria!!!
Bem, agora sigo meu caminho já que pude refletir um pouco sobre esse tal de cinema negro. Meio tardiamente confesso, mas antes tarde do que nunca. Sigo escrevendo sobre esta mais uma arte negra, com suas películas boas de serem vistas ou exemplares vergonhosos que mais dão vontade de apertar o stop antes de tudo acabar. Como qualquer tipo de cinema o cinema negro tem seus bons e maus exemplares. Mas que existe, existe!

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

O PAÍ Ó... NO CAMELÔ!

Centro da cidade, ano passado, um filme lançado nos cinemas faz sucesso estrondoso em todo Brasil. Este filme, pouquíssimo tempo depois, estava a ser comercializado nos camelôs de todo o país e logo os DVDs esgotavam nas barracas ou naqueles ambulantes que estendem lona no chão e vendem seus produtos ali mesmo sob a calçada. Este filme: Ó Pai Ó. Daí pra frente não é novidade para ninguém, o filme fez bastante sucesso, mostrou uma Bahia hipercolorida para os não baianos, colocou o Bando de Teatro Olodum em um novo patamar (o cinema, já tinham alcançando, por exemplo, com Jenipapo, mas o sucesso somente veio nas telonas com O Pai Ó, que por acaso é da mesma diretora). E com o sucesso do filme veio a super/hiper/mini/série.
Foram quatro capítulos sem ligação direta exibidos toda a sexta feira, na Globo. Não sei muito bem como foi à repercussão em outros estados (a série foi escolhida como melhor de 2008, vencendo concorrentes como Capitu), mas aqui na Bahia a série, assim como o filme, virou febre, um vírus, sei lá... mania pura! A toda hora tinha gente repetindo o nome do programa ou bordões da mesma ou até os trejeitos dos personagens, seguidos de uma gargalhada geral. No Sábado a conversa era uma só no ônibus: Assistiu ó Pái Ó ontem? Não? Então lá vem o cara explicando detalhe por detalhe para o outro que não havia visto e tome trejeito daqui, piada dali, ditado baiano acolá. Uma agonia...
Bem, poderia muito bem esboçar todos os traços ruins e benéficos da série e do filme, mas tenho a certeza que um monte de gente já fez isso antes de mim. O que me interessa na propagação da série mais quista do ano passado é uma outra coisa... Estou eu este final de ano, novamente no Centro da Cidade, quando me deparo com um DVD esplendido! Uma dessas coisas que somente um “piratero” inteligente sabe fazer. O Pái Ó a série todinha, reunida em um único disco. O mesmo fenômeno do ano anterior repete-se. O povo completamente voa nos DVDs.
Aviso logo que não concordo com a pirataria. E não estou falando isso para ser politicamente correto. Os dvds já não tinham muita qualidade, agora que baixaram o preço (R$ 1,00 em alguns lugares) não há qualidade alguma. Com sei disso? Pois quebrei minha cara comprando dvds piratas. Alguns, confesso, dei graças a Deus por existirem, como o filme Os Grandes Debatedores – produzido por Oprah Winfrey e protagonizado por Denzel Washington – que concorreu ao Globo de Ouro, mas não passou pelos cinemas brasileiros. No camelô tinha e eu comprei! Filme bem ao estilo “vi a versão pirata”, cheia de defeitos e cortes abruptos durante sua exibição.
Mas também não concordo com o preço dos dvds originais, mesmo agora com as produtoras baixando os preços com a expansão da pirataria. São caros, às vezes não vale a pena dar em um dvd simples R$ 50,00!!! O artista não tem nenhum cuidado com seu público fiel ou com quem o descobre e acha que o ego dele e suas produções desbaratinadas valem um preço exorbitante. O dvd vem com o show ou o filme seco e olhe lá... Isso é falta de respeito. Dvds assim deveriam ser vendidos em balaio!
Nós sabemos muito bem que a pirataria está aí para todos verem. E que os vários tipos de pirataria têm público consumidor distinto. Geralmente moradores dos bairros nobres, brancos, com internet banda larga a disposição, baixam de casa mesmo suas séries e filmes prediletos. Filme pirata no conforto do lar, legendado, que logo é transformado em dvd para ser guardado junto à pilha de filmes, escondido. Já os moradores dos bairros periféricos, a galera do subúrbio, maioria esmagadora negra, sem internet ou sem PC em casa, depende do camelô e de seus filmes dublados (às vezes em espanhol, como a versão do novo filme de Will Smith de um amigo meu), capengados, com imagem semelhante a uma VHS semi-nova.
Muito desse caminho é feito de “cima para baixo”, a pirataria vindo da NET e passando de mão em mão nos ambulantes da vida. Mas é certo que hoje filme pirata é comercializado para todas as cores, classes, de maneiras diferentes, mas chegam lá. Fechando locadoras, despencando o preço dos DVDs originais, aumentando o desemprego, fazendo com que os artistas consagrados façam milhares de campanhas contra a pirataria, revelando artistas novos (lê-se Fantasmão, Harmonia do Samba...), popularizando o cinema (coisa que Hollywood nunca conseguiu realmente fazer), sustentando o crime, popularizando ainda mais a pornografia (com DVDS das Brasileirinhas e da Pau Brasil sendo vendidos abertamente nas ruas), entregando a nova mania do momento os dvds dois, três, quatro, cinco em um! Tudo isso sendo feito por um preço realmente baixo, que atinge a toda a população.
Por conta da pirataria muita coisa ruim aconteceu. Mas a população negra e pobre, mesmo que com a baixa qualidade dos dvds piratas, pode usufruir do mesmo filme que o “bacana” da zona nobre assiste no multiplex. Filme é informação e esta é sinônimo de poder. E poder ao alcance das mãos por uma pechincha? Realmente irresistível! Foi assim com o fenômeno Kiriku e a Feiticeira e sua continuação, os dois filmes foram espalhados pelo Brasil cópia por cópia feito em casa ou multiplicada nos ambulantes. A pirataria como tudo nesta vida, tem suas vantagens e desvantagens... Uns lucram, outros ficam desempregados, uns não mais esnobam, outros agora assistem... E segue as vendas do novo dvd do momento, Ó Pai Ó da telinha para o camelô bem perto do seu dvd.e que venha a continuação ou a segunda temporada... onde será que você vai assistir?...